quarta-feira, 21 de março de 2012

Artigo: Metendo o bedelho

Para além do pacto federativo, com sobreposição de funções e usurpação de direitos entre agentes da federação, a intromissão de entidades, governo e sociedade organizada em funções que não lhes são atribuídas tem despertado atenção.
É abundante a gama de exemplos. O mais emblemático, pela inversão, deve ser o caso das Organizações Não Governamentais, as ONG´s. Criadas para auxiliar a população nos vácuos das administrações públicas, usufruem de dinheiro público e fazem o que, ao abdicarem de responsabilidade, União, estados e municípios deveriam ter feito.
Talvez isso se deva pela apoderação tácita e recíproca de direitos e deveres, pelas definições turvas entre os poderes. Legislativo e Executivo perdem-se em meio às políticas de barganha e acabam por transferir as funções de legislar e mandar executar para o Judiciário. Nosso maior ente federativo é o Supremo Tribunal Federal.
Daí surgem as figuras alicerçadas na iconoclastia do popular. Figuras como a dos ex-presidentes assentados no poder: Sarney, Collor, Lula. Este que, por sua obsessão em extirpar o PSDB do cenário nacional, nomeia e exonera, aloca e transfere cargos e pessoas. Com que poder? Com que direito? Somos o país do populismo que ainda obriga instituições a afixar fotos dos seus líderes políticos.
Esse tipo de simbolismo, mais um arquétipo a ser questionado, é outro motivo de polêmica interferindo nas esferas decisórias. Crucifixos nos órgãos do Judiciário, citações bíblicas em novas resoluções jurisprudenciais,   sincretismo entre religião e Estado e a influência das igrejas na política são esteiras da justaposição de funções que vivemos cotidianamente. O Estado laico está morto.
Já no lado familiar, a menor entidade de nossa sociedade vê na Lei da Palmada a ingerência governamental. Parlamentares e ministros da área defendem com afinco a intervenção, sem sequer se preocupar com direitos, fiscalização ou com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que, regulamentado, resolveria a questão.
Na iniciativa privada, não é diferente. Por conta de interesses empresariais, a Federação Internacional de Futebol (FIFA) tenta interferir na Lei da Copa, que tramita no Congresso, e busca autorizar, entre outras demandas, a venda de bebidas, mesmo em estados que possuem legislação contrária, como o Rio Grande do Sul.
Pra não ficar pra trás, o Governo Federal influenciou na assinatura de contrato entre Andrade Gutierrez e Internacional para as reformas do Beira Rio. Questionável? Não, quando se trata de “pão e circo”. Sim, quando se reponde se essa é uma função de interesse público ou de governo.
Assim, “meter o bedelho”, que tem sua origem na inconveniência, curiosidade e até desconhecimento de quem o faz, passou a ser regra em nossa sociedade. É essencial que, nessa desordem de poderes e atribuições, o papel de federação e pacto federativo não se perca, que público e privado não se misturem, e que cada um, assim como eu, “cuide de seu nariz”.
Ou estarei eu também metendo o bedelho?


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