Publicado na edição 121 do Jornal do Centro - Abril 2008
“Sinto uma dor infinita
Das ruas de Porto Alegre
Onde jamais passarei...”
(Mário Quintana)
Como Quintana, sou um daqueles que nasceu no interior, mas que era porto-alegrense desde sempre. Também existe em mim um olhar sobre a cidade, onde “há tanta esquina esquisita,tanta nuança de paredes”.
Como caminhar pela Rua da Praia, que é tão mais tranqüila quando sai do Gasômetro e cruza por nós atravessando a Alfândega, alardeando nossos anseios de democracia na esquina com a Borges, sem perceber o caminho da história para chegar até o agora?
E no meio da multidão que compõe o quebra-cabeça desses que falam “di”, o que esperar da babel que nos leva e traz, sai do Mercado Público e contorna os mapas do mundo daqui: Açorianos, Argentina, Monte Vidéu e mesmo Porto Alegre até a nossa Redenção própria em meio às praças?
Quem são os moradores e visitantes, turistas, filhos adotivos da cidade do Porto dos Casais, dos amantes e do gaúcho que assiste ao pôr ou nascer do sol?
E o caleidoscópio que forma o corpo de quem mora aqui, será apenas reflexo nos braços do Guaíba?
Quando vim, o tamanho da cidade me assombrava, suas cores me assustavam, e o escuro da noite só era acalentado pelo bate-papo na rua da República, por essa vida cultural em cada sombra, pelo novo mundo dado a quem chegara já se sentindo em casa, como se à mesa da sala estivesse.
Depois, como tantos outros daqueles que “vendorô” e “compro-vale-vendo-vale”, a oportunidade aos que aqui estão. Somos todos desbravadores de um trabalho formal, de um minuto de certeza entre o primeiro e o último tri-legal. Bem-aventurados nós mesmos, ambulando pelas trajetos da cidade, do Paço ao Largo, do início ao Bom Fim.
E nestes dias de festa, uma semana, é preciso ter um pouco mais de romance ao olhar a capital. Encontrar o belo no envelhecer dos prédios que tombaram, das folhas que caíram e nas crianças que prospectam futuro nos balanços da praça da Matriz. E na esperança daqueles que oram. Ali, no meio de tantos poderes, o singelo poder de estar.
Porto Alegre estende sua mão, derruba seus muros e, no gentílico de porto-alegrense, oferece seus braços para acalmar o pesar daqueles que não são daqui. E que todos possam ter a sorte que tive, à luz que cidade me deu, de filho adotivo da capital, de pai deu um menino aqui nascido.
Somos porto-alegrenses, seja pela opção que fizemos, pelo coração da capital de portas abertas, e acreditamos sempre que, se há um lugar para se morar, é aqui, da beira do Cais ao alto do morro, do nível do rio ao Santa Tereza.
Doce ancoradouro de um alegre porto!